sábado, 8 de setembro de 2007

Afetos à mostra


“Afetos Roubados no Tempo”, um título forte para uma exposição que carrega elementos intensos da subjetividade de seus participantes, onde a proposta é agregar obras de arte de diversas partes do mundo, em um total de quatro continentes envolvidos – Américas, Europa, África e Oriente, por meio de 365 módulos, denominados “objetos-afeto”, que representam cada dia do ano. Idealizada por Viga Gordilho, artista plástica e doutora em Artes pela USP, e patrocinada pelo Caixa Cultural 2007, a exposição itinerante conseguiu reunir, no total, 730 artistas, e foi inaugurada em 2005, no Instituto Goethe, em Salvador, dirigiu-se, em 2006, para Recife, na Galeria Capibaribe, da Universidade Federal de Pernambuco; esteve, ainda nesse mesmo ano, no Museu Théo Brandão, aqui em Maceió e em São Paulo, no Espaço Eugénie Villien / Faculdade Santa Marcelina.

Desde o dia 29 de agosto, a exposição retornou a Salvador e, dentre seus participantes, estão 40 artistas alagoanos, a exemplo de Ana Glafira, Celso Brandão, Dalton Costa, Delson Uchoa, Francisco Oiticica Filho, Lula Nogueira, Maria Amélia, Persivaldo Figueirôa, Rogério Gomes, Tânia Pedrosa, Tchello d’Barros, Viviani Duarte e Wado. É a arte alagoana ampliando seus horizontes e rompendo fronteiras, nacionais e internacionais, pois de Salvador, a mostra seguirá para cidades européias e se instalará permanentemente na Universidade de Pretória, na África do Sul.

Tchello d’Barros, artista visual, recebeu o convite da curadora da mostra, Ana Glafira, e entrou no projeto como produtor executivo e exibindo um trabalho ousado: um livro objeto, contendo micro-poemas eróticos e um ensaio fotográfico com a mesma temática, que permitia ao público manuseá-lo e perceber a relação existente entre texto e imagem. Assim como ele, outros artistas alagoanos foram convidados a criar objetos que atendessem à proposta do projeto: “mostrar obras visuais que ecoem suas ‘matrizes’ de origem, aproximando culturas peculiares e artistas que nunca se encontraram”, a partir do diálogo de diferentes graus de trajetória e exercício poético e estético.

Ele acredita que a participação dos alagoanos no projeto é uma importante oportunidade da arte alagoana contemporânea conseguir uma visibilidade mais ampla no circuito das artes no Brasil e afirma que a participação de artistas alagoanos em projetos fora do Estado, dá-se pela falta de iniciativas dessa natureza por parte das instituições culturais em promover, resgatar e divulgar os valores culturais locais.

Quando esteve em Maceió, a exposição incentivou a produção inclusive de artistas iniciantes, que contribuíram com objetos, fotografias, e pinturas exercitados em diversos suportes e soluções originais. Tudo isto em pequenos formatos, 10cm² ou cúbicos, de acordo com Ana Glafira, curadora da mostra, um pré-requisito da exposição em função da quantidade de artistas e para ser possível aproximá-los em diversificadas montagens, que criou um cubo costurado à mão, com a Série Palavras Cotidianas ampliadas em lona.

Sobre as sensações proporcionadas aos visitantes pelos trabalhos apresentados, Ana Glafira, revela: “Depende do repertório de cada um e da disponibilidade de interagir com as proposições poéticas dos artistas. Então, não podemos responder quais são, mas podemos dizer que elas variarão do estranhamento, da repulsa, da negação até o não-estranhamento, a alegria, o prazer e o encantamento. ‘Cada um tem o sublime que pode e merece’, esta frase é minha, e a transformarei em flâmula e pára-choque de caminhão. Os sentimentos de sublimes podem ser atualizados ou não diante da complexidade da produção artística atual.”


Fase itinerante

A arte alagoana está realmente em um período itinerante. Tchello d’Barros estará expondo, a partir do dia 22 de setembro, uma obra no projeto cultural 1ª Primavera dos Museus, uma exposição coletiva de artistas brasileiros, cuja temática é “Meio ambiente – Museu, Memória e Vida. Segundo Tchello, sua proposta é dinamizar a relação do público com a modalidade literária do poema, que será apresentado com o recurso de uma instalação num paredão da instituição. Assim, o poema passa de informação literária, para uma obra visual e adquire conformação tridimensional. Sobre a obra, afirma: “O sentimento transmitido neste trabalho é muito positivo, até porque é uma poema que tem ampla aceitação popular e é um dos preferidos entre meus leitores. E gosto muito da proposta de libertar o poema da página do livro e apresentá-lo em outros ambientes e espaços”.

Já Ana Glafira está integrando o grupo de artistas que expõe, desde o último dia cinco, suas obras na Bienal B, em Porto Alegre. Ela foi selecionada através de um edital e apresenta, para o Sul do país, a região do Porto de Maceió, sob um olhar que foge da obviedade. As fotografias de Ana Glafira revelam fragmentos de um todo, num minimalismo poético e intenso, onde um filete de céu dialoga com a ferrugem de uma estrutura, por exemplo. Ela explica: “O porto sempre é registrado por olhares muito óbvios. Ir nos detalhes da monumentalidade das suas máquinas, objetos, navios e paisagens foi o meu interesse. É propor novos olhares através da geometria sensível e com isso tentar surpreender o possível público destas imagens decupadas, buscando abstraí-las de seu entorno”.

Nota-se que Alagoas está entrando em uma nova fase, de maior divulgação de sua arte, seguindo caminhos alternativos, em especial com mostras coletivas, que são a melhor forma de expressar a força cultural dos artistas locais.



Publicado no jornal A Notícia - Ano VI - Edição Nº 293


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